Afinal, onde pára a Voyager 1? Já saiu, ou não, do sistema solar?
Voyager 1
Nunca um engenho humano chegou tão longe. A Voyager 1 é como um braço
humano tão gigante que se estende desde a Terra até mais de 18.255
milhões de quilómetros de distância – ou seja, 121,7 vezes a distância
da Terra ao Sol. Continua viagem a caminho das estrelas, mas se já saiu
do sistema solar é motivo de polémica: uma equipa de cientistas disse
que sim, horas depois a equipa da NASA que é guardiã da Voyager
desmentiu tudo. Primeiro, William Webber,
da Universidade do Novo México, em Las Cruces, e o falecido Francis
McDonald, da Universidade de Maryland em College Park, ambas nos EUA,
anunciaram que a sonda da NASA, lançada a 5 de Setembro de 1977, já
estava fora do sistema solar. O seu estudo foi publicado online nesta quarta-feira, pela revista Geophysical Research Letters, da União Geofísica Americana. O
que significaria isto? Significaria que a Voyager 1 estaria a viajar
para lá da heliosfera, a região do espaço dominada pelo Sol e pelas
partículas electricamente carregadas do vento solar. Essa região é uma
enorme bolha em redor da nossa estrela e, para lá dela, o espaço
interestelar é dominado pelos ventos de outras estrelas, pelos gases e
poeiras que impregnam a Via Láctea. Embora não haja consenso sobre
onde fica a fronteira do sistema solar – onde termina o império do Sol e
começa o império de outras estrelas –, a influência do Sol estende-se
muito para além dos planetas. Mas o fim dessa bolha, a heliosfera, não é
abrupto. Primeiro, é preciso ultrapassar uma zona chamada “fronteira de
choque”, onde a velocidade supersónica dos ventos solares desce
abruptamente e começam a sentir-se os efeitos dos ventos de outras
estrelas próximas. Só depois de atravessar essa região, que é a camada
exterior da heliosfera, é que se chega à heliopausa e se entra no espaço
interestelar. A heliopausa é uma fronteira menos ambígua do
sistema solar, porque aí as sondas passarão a estar imersas em matéria
resultante das explosões de outras estrelas. Mas há quem considere
que a derradeira fronteira é onde a gravidade do Sol deixa de dominar, o
que ainda fica muito para lá da heliopausa. Depois da heliopausa, a
gravidade do Sol ainda mantém uma horda de milhões de cometas, a nuvem
de Oort. Só daqui a 20 mil anos as duas sondas terminarão a sua passagem
pela nuvem de Oort, para continuarem a vaguear pelo cosmos, sem
voltarem a entrar noutro sistema solar. A Voyager 1 foi o primeiro
aparelho de fabrico humano a “sentir” a fronteira de choque, em
Dezembro de 2004, quando se encontrava a cerca de 14.000 milhões de
quilómetros do Sol. Agora, a equipa de William Webber relatou a
chegada da Voyager, a 25 de Agosto de 2012, a uma zona diferente. Nela, a
sonda teria registado mudanças drásticas na radiação: segundo um
comunicado da União Geofísica Americana, os raios cósmicos aprisionados
na helioesfera teriam caído a pique, para menos de 1% dos níveis
anteriores; e os raios cósmicos galácticos, oriundos do exterior do
sistema solar, teriam aumentado para valores nunca antes medidos pela
Voyager, chegando ao dobro. “Em poucos dias, a intensidade da
radiação aprisionada na heliosfera desceu e a dos raios cósmicos subiu,
tal como é de esperar se estivesse a sair da heliosfera”, disse William
Webber, no comunicado. “Parece que a Voyager 1 saiu da principal região
modulada pelo sistema solar, revelando que os espectros do hidrogénio e
do hélio são característicos do que se esperava para o meio
interestelar”, refere por sua vez o artigo científico. William
Webber chamou a essa fronteira de transição “helioprecipício”: se não é
a heliopausa, pelo menos já não andaria longe. Antecipava a continuação
do debate sobre se a sonda teria entrado no espaço interestelar ou se
teria, antes, chegado a uma zona separada e indefinida para lá do
sistema solar. “Diria que está fora da heliosfera normal. Estamos numa
nova região. Tudo o que estamos a medir é diferente e entusiasmante”,
acrescentou o investigador. Não
podia ter sido mais certeiro. Horas depois, a NASA emitia um comunicado
sobre a localização da sonda: “A equipa da Voyager está a par dos
relatos de hoje [quarta-feira] de que a Voyager 1 deixou o sistema
solar. É consenso entre a equipa científica da Voyager que a Voyager 1
não deixou ainda o sistema solar ou atingiu o espaço interestelar”, diz o
cientista Edward Stone, envolvido no projecto desta sonda e que
trabalha no Instituto de Tecnologia da Califórnia, em Pasadena. “Em
Dezembro de 2012, a equipa científica da Voyager reportou que a Voyager
1 está dentro de uma nova região chamada ‘auto-estrada magnética’, onde
as partículas energéticas sofreram mudanças drásticas. Uma mudança na
direcção do campo magnético é o último indicador crucial de ter atingido
o espaço interstelar, ora não foi ainda observada essa mudança de
direcção”, acrescentou Edward Stone. Outro cientista da equipa da
Voyager, Stamatios Krimigis, do Laboratório de Física Aplicada Johns
Hopkins, em Laurel, Maryland, considerou que o comunicado da NASA
explicava tudo: "Não há mais nada a dizer", referiu, segundo a revista Nature.
"Pouco podemos dizer sobre o campo magnético" até à publicação de um
conjunto de artigos científficos num dos próximos números da revista Science. "É aí que estão os dados sobre o campo magnético e não no artigo de Webber." Afinal,
onde pára a Voyager 1? Mesmo sem consenso, uma coisa é certa: depois de
ter explorado o sistema solar – com a sua irmã gémea, a Voyager 2,
lançada a 20 de Agosto de 1977 –, encontra-se em território nunca antes
explorado pelos humanos, a 121,7 unidades astronómicas (uma unidade
astronómica são 150 milhões de quilómetros, a distância média da Terra
ao Sol). Espera-se que ela (e a Voyager 2) funcione até
2020, altura em que deverá esgotar-se a energia dos seus reactores
nucleares. Então, já terá cruzado a fronteira do sistema solar e ser
apenas uma mensageira longínqua da Terra. Ou não transportasse, tanto
ela como a Voyager 2, um disco dourado destinado a saudar alguma forma
de vida extraterrestre, com o conteúdo escolhido por uma comissão
presidida por Carl Sagan: saudações em 55 línguas, 115 imagens da Terra
(da Grande Muralha da China à ponte Golden Gate), sons (de baleias, do
vento, de aves, de trovões, do choro de um bebé ou o registo do
electrocardiograma de uma jovem apaixonada) e uma selecção musical (de
Beethoven, de Louis Armostrong até à canção Johnny B. Goode, de Chuck Berry).
Fonte: Público.pt - Matéria de Teresa Firmino
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