Ausência de Chávez não será o fim do chavismo, dizem analistas
Hugo Chávez
Críticos de Chávez o acusam de adotar um estilo excessivamente
centralizador e de não ter construído uma liderança alternativa ao longo
de seus 14 anos no poder, capaz de dar continuidade ao projeto da
revolução bolivariana. Esse perfil, acreditam eles, teria criado uma
espécie de "Chávez-dependência" que gera dúvidas sobre o futuro do
governo sem Chávez no comando. "Aqueles que sonham que depois de
Chávez não há chavismo tomarão um banho de água fria quando se depararem
com a realidade", afirmou à BBC Brasil o ex-ministro Jesse Chacón. Segundo ele, se Chávez tiver que se afastar da
vida pública, o chavismo terá por "necessidade" que formar uma liderança
coletiva. "Por uma simples razão: na geração dirigente não há quem
aglutine tudo o que é Chávez. Não há ninguém capaz disso, nem dentro,
nem fora do chavismo." A historiadora Margarita López Maya também
prevê, no início, uma união pragmática dos chavistas, sem a qual existe o
risco do movimento chegar ao fim. "Se se dividem agora, sabem que irão afundar”,
disse Maya. Porém, ela acredita que os líderes “mais cedo ou mais tarde
entrarão em um processo de fratura a médio e longo prazo." A discussão sobre o futuro da Venezuela sem
Chávez era assunto vetado entre os dirigentes e a base chavista há pouco
mais de dois anos. Aquele que ousava criticar a "onipresença" do
presidente podia ser acusado de "contrarrevolucionário" e ser expulso de
qualquer assembleia ou discussão. Chávez é considerado a única figura capaz de unificar as diferentes
correntes e movimentos sociais que compõem o chavismo. Sem ele, a
tendência de disputas internas é eminente. Antecipando a tensão interna, antes de viajar a
Cuba para submeter-se à sua quarta cirurgia para combater um câncer na
região pélvica, Chávez deixou uma espécie de testamento político e
indicou seu vice-presidente, Nicolás Maduro, como eventual sucessor na
liderança chavista. A decisão, no entanto, não dá absoluta autonomia a
Maduro. O trio que compõe a cúpula da direção chavista
não trabalha, por enquanto, de maneira separada. Maduro, cuja força
política vem de sua origem sindical, precisa do presidente da
Assembleia, Diosdado Cabello, o número dois no triângulo de poder, para
dialogar com os militares - um dos pilares de sustentação do chavismo. Ambos, no entanto, necessitam do pouco
carismático ministro de Energia e Petróleo, Rafael Ramirez, o número
três do triângulo. Ramirez é conhecido popularmente como o "dono do
talão de cheques" por controlar a estatal petroleira PDVSA, coração da
economia do país. Nas últimas semanas, dirigentes políticos
opositores e os meios de comunicação privados vinham alimentando
informações sobre uma suposta divisão entre Maduro e Cabello. Para
responder aos rumores, os dois chegaram a se abraçar em duas diferentes
manifestações públicas, para baixar a tensão na base chavista que, por
enquanto, só confia em Chávez. "Dizem que Diosdado e eu estamos nos matando
(...) Estamos nos matando de lealdade a Chávez e à pátria", disse
Maduro, ao abraçar a Cabello. O presidente venezuelano permanece hospitalizado
em Cuba após sofrer complicações em sua quarta cirurgia. De acordo com o
governo, a infecção respiratória que enfrenta está controlada, porém a
insuficiência respiratória persiste. Há mais de um mês Chávez não é visto ou ouvido
em público, fator que aumenta a tensão no país sobre o futuro da
Presidência e as consequências de uma eventual era pós-Chavez. Outro desafio para o chavismo como movimento é a
herança carismática de Chávez. Sua simbologia tende a fortalecer o
governo e sua carga emotiva, porém, isso também tende a ser uma "carga
pesada" para aquele que pretenda ocupar seu lugar na liderança política
do chavismo."É um dos personagens mais importantes e significativos dos últimos
cinquenta anos. Há poucos com seu calibre. No contexto latino-americano,
é o mais interessante desde Fidel Castro", afirmou o historiador
britânico Richard Gott, especialista em América Latina, autor do livro À Sombra do Libertador - Hugo Chávez Frias e a transformação da Venezuela. Para Gott, sem Chávez, a Venezuela entrará em um
período de "normalização". "Será um país normal, sem tanta projeção,
sem um líder carismático", afirmou. Especialistas ouvidos pela BBC Brasil, tanto
simpatizantes como críticos à revolução bolivariana, concordam com a
definição do Chavismo como um movimento histórico, de bases populares,
que tem como pilares ideológicos "o socialismo, o anti-imperialismo, a
justiça social, soberania nacional e integração latino-americana". Para além dos termos conceituais, na opinião do
analista político Oscar Schemel, da Consultoria Hinterlaces, "o chavismo
se constitui em uma unidade emocional, numa identidade de classe e em
uma nova cultura político popular", afirmou Schemel. Desde que foi diagnosticado com câncer, a figura política de Chávez como mito passou a se fortalecer. Dezenas de missas, cultos, rituais indígenas e de santería (culto afro local) são realizadas diariamente em nome da recuperação da saúde do presidente. Nas ruas, velhos e novos grafites com a imagem
de Chávez disputam espaço nos muros da capital. Em algumas casas, a foto
do "comandante" está colocada em um altar, sempre acompanhado de uma
vela. "Ele (Chávez) nunca vai morrer. Mesmo se não
estiver mais aqui, seu pensamento nunca morrerá", disse uma
simpatizante, durante manifestação de apoio ao presidente.
Fonte: BBC Brasil - Claudia Jardim - De Caracas
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