quinta-feira, 5 de agosto de 2010

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Fernando Henrique Cardoso

FHC retrata um Gilberto Freyre 'cosmopolita'

Diante de uma plateia que lotou a tenda principal, o sociólogo e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fez ontem à noite a conferência inaugural da 8.ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Seu tema foi o pensamento e a perenidade da obra de Gilberto Freyre (1900-1987), autor homenageado este ano pelo evento literário. Saudado pelo historiador Luiz Felipe de Alencastro e segurando nas mãos um maço de folhas de papel, Fernando Henrique confessou para a plateia ter demorado "um mês para escrever isso aqui" e de ter relido boa parte da obra freyriana, além revisitar inúmeras fontes bibliográficas, até compor o texto da conferência. Que preferiu não ler, "porque senão vocês perdem a hora do jantar". Falou de improviso durante mais de uma hora, seguindo ideias básicas do texto não lido (íntegra no estadão.com.br/cultura). Entre elas, explicou por que se difundiu a versão de que a escola paulista de sociologia, ligada à formação da Universidade de São Paulo (USP) e influenciada de perto por Florestan Fernandes, de quem FHC foi aluno e assistente, era avessa a uma suposta sociologia sem método, desenvolvida pelo célebre pernambucano.  FHC admitiu que o autor de Casa-Grande & Senzala, naqueles anos 30, parecia disseminar uma visão nostálgica de Brasil, que foi tido mais como ensaísta do que como cientista social, desenvolveu conceitos ambíguos e não raro deixava análises sem conclusão. "Mas hoje é possível entender a contemporaneidade de Gilberto Freyre. Era um sujeito cosmopolita, aberto para o mundo, porém pensava como antropólogo, valendo-se de uma formação literária sólida." Foram inúmeros os exemplos da originalidade, ainda que cercada de polêmicas, da obra do sociólogo pernambucano. FHC insistiu num ponto: a expressão "democracia racial", tão questionada por estudiosos e sempre atribuída a Freyre, foi usada pela primeira vez por Roger Bastide, professor pioneiro da USP, ao traduzir para o francês Casa-Grande & Senzala.  Em vários momentos, o ex-presidente recorreu ao humor, preocupado em facilitar o entendimento de uma exposição de conteúdo acadêmico e pouco literário. Ao defender que Gilberto Freyre tinha se aproximado do movimento modernista brasileiro, mesmo sendo um regionalista confesso, FHC ironizou: "Gilberto tinha uma compreensão original do modernismo. Nós, paulistas, aqui nos salões da dona Veridiana, é que ficávamos embevecidos com Blaise Cendrars." Referiu-se ao escritor suíço de vida itinerante, que influenciou fortemente Oswald de Andrade.  Em outros momentos, FHC citou com admiração Sérgio Buarque de Holanda, cujo pensamento e análiseem torno do "homem cordial" seriam o melhor contraponto a Gilberto Freyre. Por fim, exortou que a Flip homenageie o autor de Raízes do Brasil em uma de suas edições futuras.  Sem política. Tratado como sociólogo e professor durante toda a palestra, Fernando Henrique, também articulista do Estado, não falou em política. Em um único momento, ao comentar o estilo de Gilberto Freyre, sempre propenso a buscar conciliações, acrescentou que "hoje em dia, estão todos tão conciliadores", provocando risos da plateia. Mas ficou por aí. Ao término da exposição, foi aplaudido de pé por boa parte do público e, emocionado, ameaçou repetir tudo o que havia dito.  Hoje a Flip apresenta a primeira das três mesas de debate em torno da obra de Gilberto Freyre, contando com a participação do também pernambucano Edson Nery da Fonseca, de 89 anos, escritor, perito em biblioteconomia, um dos fundadores da Universidade de Brasília (UnB)e grande especialista na obra freyriana.

Fonte: Laura Greenhalgh - O Estado de S.Paulo

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